terça-feira, 14 de novembro de 2017

Resenha #68 - O Alienado (Cirilo S. Lemos)

A meta de voltar a ler/resenhar mais fica bem mais fácil lendo livros como O Alienado (2012), romance de Cirilo S. Lemos. É uma leitura para quem não tem medo da sensação de pisar em falsoVejo nela tudo de positivo que a literatura de Ficção Científica brasileira pode oferecer de bom ao leitor. Temos uma obra com uma série de referências que foram tão bem digeridas e devolvidas ao leitor que confere uma aura de clássico. Essa ousadia felizmente foi aliada a qualidade resultando num grande livro que só não é mais falado, certamente por ser brasileiro.

A forma conta mais aqui do que a estória. O romance se apresenta com fragmentos de momentos diferentes da vida do protagonista com nome de filósofo, Cosmo Kant. Temos, no seu presente, um abalo após ver um sujeito sair do seu espelho enquanto é perseguido pelos Metafilósofos uma espécie de ceita que controla a distópica Cidade-centro com mãos de ferro e máscaras de couro. Em outros fragmentos, há momentos da infância de Cosmo e trechos de um romance que ele chegou a rabiscar, além de criativas passagens em quadrinhos. A cada trecho, cabe ao leitor montar o quebra-cabeças. Temos o efeito constante de relembrar das partes anteriores, que recebem novos sentidos a medida que a trama se (des)enrola. Temos um excelente uso das referências, a personagem Maria Cecília é um bom exemplo disso. Ela se parece com as mulheres das histórias de Philip K. Dick (manipuladoras, soando como a voz da consciência) e a forma como ela se encaixa na estória eleva o uso de um arquétipo manjado de personagem.

Vale apontar que, para uma estória complexa e não-linear (que pode assustar o leitor casual) não temos aqui o pedantismo do infodump (contextualizações excessivas). Temos o essencial para entendermos os elementos distópicos, a troca de identidades e o questionamento da realidade. Este último é um tema recorrente no meu autor favorito, Philip K. Dick e aqui vemos o mesmo tema numa forma própria. Foi uma experiência muito boa ler tudo isso em nossa língua (sendo mais específico, em uma obra não-traduzida) e com nosso modo de falar. Isso descomplica o que não precisa ser complicado e deixa o caminho livre para mergulhar nesse labirinto bem construído. Quando ao final, temos as questões resolvidas e deixa um bom impacto após a leitura, algo como: "Cirilo, seu fdp!".

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