segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Resenha #12 - A Máquina Diferencial (William Gibson e Bruce Sterling)

[SEM SPOILERS]
A Máquina Diferencial (William Gibson e Bruce Sterling) é a obra de referência do subgênero Steampunk, por toda a estética construção para o livro que se pauta numa História alternativa. A premissa é a de que a Máquina diferencial, de Lorde Babbage, foi concluída e implementada pelo governo britânico culminando numa versão mais acentuada da Revolução Industrial que estudamos na escola. Temos uma grande quantidade dos desdobramentos sociais, políticos, tecnológicos e estéticos, deste mundo envoltos em mistérios intrincados com a tecnologia de computadores.

A estória acompanha três personagens principais: Sybil Gerard, uma prostituta filha de um revolucionário ludita traído que encontra Mick Radley auxiliar de um político Texano que deseja dar um golpe de estado no Texas;e  Edward Mallory, paleontologista famoso que retorna a Londres depois de uma expedição bem sucedida, onde descobre o brontossauro; e Laurence Oliphant, um jornalista misterioso que junta algumas partes do misterioso quebra-cabeça em relação dos cartões perfurados pertencentes a Lady Ada Byron. O mistério envolve inclusive a identidade do narrador onisciente do livro.

Fazendo jus ao punk, do Steampunk 
O mundo criado por William Gibson e Bruce Sterling, é grande parte do atrativo da obra. Uma mundo movido a tecnologia de vapor e engrenagens mecânicas á partir da Inglaterra, deu muita margem a interpretações glamourosas e luxuosas da estética steampunk. Mas não se engane, é um mundo tão sujo e cheio de personagens marginais como o cyberpunk. Um mundo movido também a carvão que deixa a acidade tão poluída e nublada da fumaça das fábricas como as grandes cidades da China de hoje. Os personagens reclamam da poeira por muito mais tempo que comentam vestuários luxuosos. A Máquina Diferencial faz jus tanto ao vapor quanto ao punk que compõe o subgênero que lhe é atribuído.

O que ajuda e o que pode atrapalhar nesta jornada
Um aspecto que se tornou marca das obras Steampunk é que suas edições primam pela estética. Não refiro-me apenas a capas bonitas, mas a busca por um linguajar da época, mapas, informações adicionais como glossários de termos e personagens, tanto os históricos como os criados para a obra. Isso com certeza ajuda o leitor a imergir neste mundo alavancado pela dupla Gibson e Sterling. Contudo, o leitor pode encontrar dificuldades na leitura caso não conheça um pouco do contexto da Revolução Industrial.

Um dos requisitos para curtir uma história alternativa é conhecer um pouco da história, digamos, "oficial" para poder viajar nos cenários que nunca se concretizaram e poder surpreender-se com eles, por exemplo nos Estados Unidos que se despedaçaram politicamente frente ao poderio do império britânico, que por sua vez é motivador da presença do General Sam Houston na primeira parte da história. O fato do final não fornecer explicação para todos os mistérios da trama também pode decepcionar o leitor. Mesmo aqueles momentos explicados, não o são de modo explicito. Finalmente, apesar do livro não ser imenso é bastante complexo e exige do leitor um fôlego maior para apreciá-lo.
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quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Resenha #11 - O Mundo de Rocannon (Ursula K. Le Guin)

O Mundo de Rocannon (The Rocannon's World) é o primeiro livro de Ursula K. Le Guin. Nesta obra ela consegue em poucas páginas trazer uma história rica onde aborda os mitos e a etnografia de forma profunda sem ser pedante. Esta é uma de suas características mais cativantes, com uma escrita habilidosa, trazer temas complexos de forma prazerosa ao leitor. O livro também é o primeiro do que viria a se tornar o "Ciclo de Hainnish" junto com mais seis livros, incluindo seu mais notório "A mão Esquerda da Escuridão".

A estória
Rocannon é um etnógrafo espacial que faz parte da "Liga de todos os Mundos" sediada no planeta Hain. Ele está em missão num planeta desconhecido não cartografado, que orbita a estrela Formalhaut. O planeta possui várias espécies inteligentes, algumas divididas em senhores e servos e outras em tribos coletivistas. A nave de Rocannon é destruída, por uma força rival a Liga, junto de toda sua tripulação e ele é o único sobrevivente. Começa um jornada para conseguir enviar um pedido de socorro para a liga. Rocannon parte com uma expedição junto com os senhores de Harlam, seus aliados.

Ficção Científica ou Fantasia?
Durante a jornada é fácil achar que estamos em meio a uma aventura de Fantasia, pelos personagens que vivem em um sistema parecido com o feudal uma visão particular que eles tem do viajante espacial. É nesta relação que Le Guin brinca com os mitos que se formam entorno de Rocannon. Existe a justificativa cientifica, pois quando Rocannon está em sua nave FTL ("mais rápida que a luz") no espaço  o tempo passa mais devagar, e suas primeiras visitas ao planeta o fizeram conhecer gerações diferentes dos habitantes do planeta. Existe a explicação mitológica para a existência de Rocannon, o "Olhor", "senhor das estrelas" aquele que guarda uma joia sagrada/amaldiçoada para o povo de Haram, um amigo e aliado de Rocannon.
Nesta primeira obra já temos uma ideia de como a escrita de Le Guin consegue fazer uma simples aventura se destacar das demais do gênero. Sem exibicionismo em relação a ciência, nem a Fantasia. Um romance rápido de e sem excessos. Contudo é difícil de encontrar, mas a leitura compensa.
Ficha técnica
Título: "O Mundo de Rocannon" (The Rocannon's World)
Autor: Ursula K. Le Guin.
Editora: Ediouro
Nº de páginas: 217
Ano: 1977 (1966).
Aquisição: Comprado sob encomenda em um em sebo por 17 reais.
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sábado, 5 de dezembro de 2015

Resenha #10 - Fluam, minhas lágrimas, disse o Policial (Philip K. Dick)

[SEM SPOILERS]
"Fluam, minhas lágrimas, disse o policial" (Flow my tears, the policeman said) é uma das obras mais emocionais de Philip K. Dick. Isso não significa que o livro seja meloso, mas intimista com certeza. O autor aborda temas como identidade, drogas e em menor proporção a fama e a governos autoritários.

O mundo onde se desenrola a estória é uma ditadura da polícia, fruto de uma segunda guerra civil nos EUA. Nela, estudantes vivem sob cerco nos esgotos, os negros foram esterilizados e projetos de reprodução de eugênia chegaram a ser tentados. A televisão ganha uma influência na sociedade, onde a tecnologia de carros voadores e viagens interplanetárias são corriqueiras.
Acompanhamos Jason Taverner, uma celebridade, que possui um programa semanal na TV e vários discos gravados, não demora muito para vermos que Jason é um sujeito manipulador e egoísta que usa seu charme para conseguir o que quer. Depois de uma discussão com uma ex-amante que atentou contra sua vida ele acorda em um quarto de hotel, sem documentos. A partir daí, ele descobre que ninguém sabe quem ele é. Todos os conhecidos com quem tenta contado, parecem desconhece-lo. Os registros oficiais mostram que ele nunca existiu e a sua jornada pela busca de sua identidade se inicia. 
Capa da primeira edição brasileira com o tosco nome de: "Identidade Perdida - O homem que virou ninguém"
Identidade e a "resposta" científica
Um dos elementos originais aqui é como Dick aborda a perda da identidade. Em livros como em "Identidade Bourne" de Robert Ludlun, e em muitos filmes temos , na maioria das vezes um personagem principal que perdeu sua memória e busca sua identidade procurando certas pessoas que o conhecem e fugindo de outras. Em "Fluam minhas lágrimas", Taverner sabe quem é, mas o mundo ao seu redor o desconhece. A presença da fama em sua vida e o mundo tomado por uma ditadura policial agravam seu drama.
A busca de Taverner o leva a um dilema constante, não exclusivo deste livro, mas na obra de Dick como um todo: qual o limite entre o real e o irreal? Não nos é oferecido um chão seguro para pisar. Entramos nas dúvidas de Taverner e continuamos a querer saber o que aconteceu. Em certo momento teremos as respostas plausíveis para os questionamentos de Taverner, ouvidas da boca de um cientista. Contudo percebemos o quanto essa resposta deixa um vazio. A ciência aqui é apenas capaz de mostrar "como", mas não o "por que" de tudo ter acontecido daquela forma.
Conclusões
O tom intimista da obra é um prenuncio para o quase autobiográfico VALIS. As pessoas que Jason vai conhecendo, com seus dramas pessoais misturando-se aos dele são mostradas com muita sensibilidade por Dick, isso nos impede de rotular qualquer personagem sumariamente. Este é um efeito que engrandece a obra. Neste ponto, vejo a obra de Dick como uma homenagem aos amigos que perdeu para as drogas e que ele próprio seria vítima quando da sua morte em 1983.
Ficha técnica
Título: "Fluam, minhas lágrimas, disse o policial" (Flow my tears, the policeman said)
Autor: Philip K. Dick.
Editora: Aleph
Nº de páginas: 255
Ano: 2013 (1974).
Aquisição: Comprado na feira do livro de Porto Alegre por 38 reais. É, desisti de procurar em sebos.
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